27 de outubro, em resposta ao jogador de vôlei homofóbico Maurício Souza (via Facebook)
Caro Mauricio Souza,
Você não me conhece, mas eu te acompanho há tempos. Sou fã de voleibol e conheço sua trajetória e suas conquistas, como a de conseguir uma disputada vaga de Meio na seleção brasileira. Você foi campeão olímpico e de clubes. Mas, hoje, você perdeu um troféu valioso, que é dado a ídolos do esporte que sabem que o seu lugar vai além das quadras e campos. Um grande atleta deve ser também um grande homem, e um grande homem só se constrói com respeito a todos, sobretudo os mais vulneráveis.
A homossexualidade te assusta, e então você reage repudiando manifestações de afeto entre iguais. O filho do superman não pode beijar o amiguinho sem que você se sinta ameaçado por isso. Por quê? Já refletiu sobre isso? Pense corajosamente: Por que o amor ou o desejo de uma pessoa por outra pode te incomodar tanto? De onde vem tanto medo se a sua vida segue à parte? Eu vou te responder: o seu medo é um sintoma da sua ignorância.
Enquanto os homofóbicos buscam versículos que justifiquem seu preconceito, a ciência avança nas pesquisas sobre a sexualidade. Descobertas importantes foram feitas: Desejo não é opção, é orientação, porque não é da ordem racional e portanto não há controle sobre ele. Logo, se ninguém “escolhe” ser gay ou bi (da mesma forma que ninguém escolheu ser hétero) não há que se falar em influências ameaçadoras. Sexualidade não é modismo, é descoberta e não projeto. Não há doutrinação ou ideologia, como pensam os idiotas. Há revelações e coragem para assumir quem se é. Em todas as espécies animais há comportamentos bi/homossexuais (ao contrário do que afirmam os mesmos idiotas), uma prova científica irrefutável de que gays e bis não parte da complexa população humana e sua diversidade.
Diante disso, é preciso lidar com fatos, não com mitos ou tabus. É preciso acolher quem se descobre diferente da maioria, dizer-lhe afetuosamente: “tá tudo bem, você é diferente, mas é normal”. É preciso naturalizar os desejos sem rótulos ou piadinhas. É preciso representar, por meio da arte, outros comportamentos que difiram daquilo que a tradição consagrou como norma, normatizar a diferença (entende agora o gibi?). E para chegarmos a isso, é preciso estudar, ir à ciência, rever comportamentos que confirmam a nossa ignorância (sempre anterior às descobertas científicas).
O problema é que você escolheu o lado do negacionismo (e não é de hoje, vide seu envolvimento nas campanhas políticas). Agora, você está preso às suas crenças, às sombrias e empoeiradas tradições que recusam a luz e a faxina. Neste seu episódio, lembrei do meu falecido pai (por sinal, uma das vítimas da covid), de quem herdei a paixão pelo vôlei. A gente sempre assistia jogo junto e, quando não podia, ficava comentando as partidas por telefone. Na primeira vez que ele te viu jogar, me ligou e disse: “Quem é esse coroa? O velhinho têm vaga na seleção, hein!” Eu respondi a ele: “Pai, ele é jovem, vi no Google que tem vinte e poucos anos!” Só agora, entendi que meu pai tinha razão (sempre teve). Meu pai morreu com 80 anos, muito mais jovem que você.
Marcelo Brandão Mattos
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